Valorizar a Floresta

Ao visitar o município de Castanheira de Pera, ninguém fica indiferentes à tonalidade verde que abunda no concelho, graças aos extensos hectares de floresta que circundam toda esta vila portuguesa. Preservar o panorama paisagístico que abraça o concelho e proteger todo o ecossistema guardado nas florestas de Castanheira de Pera é uma das grandes missões do município, nomeadamente durante o verão, onde a realidade dos incêndios pode-se apresentar como um grande desafio à defesa do vasto património natural aqui presente. Neste sentido, anualmente, o município reúne esforços tendo em vista criar uma série de iniciativas que visem defendem as suas florestas e orientar os seus proprietários a gerir as mesmas.

Da ancestralidade da economia agrossilvopastroril à monocultura florestal

O modo como gerimos a floresta está diretamente relacionado com o valor económico que lhe pretendemos atribuir. Recuando no tempo, a primitiva economia agrossilvopastoril combinava a pastorícia, fazendo uso extensivo de terrenos baldios, cobertos por mato rasteiro cobrindo as serranias que alimentavam as centenas ou milhares de cabeças de cabras e ovelhas, com o minifúndio da agricultura de subsistência familiar, nestas terras de xisto duramente amanhada entre socalcos de sequeiro e as estreitas leiras de regadio no fundo do vale. A produção de castanha foi a base da alimentação até épocas tardias, concorrendo com a batata, até a doença da tinta dizimar os densos soutos da Castanheira. A corrente das águas da Ribeira de Pera fazia mover a roda hidráulica, no giro dos engenhos da moenda dos moinhos e do apisoar dos tecidos de lã nos pisões. Depois, a demanda de carvão vegetal do progresso fabril fez com que as encostas da serra ficassem ainda mais despidas. Seguiu-se, nesta zona do Pinhal Interior Norte voltada para o Zêzere, a exploração dos extensos pinhais a perder de vista entre os montes e vales. Monocultura bastante dinamizada durante o Estado Novo, do pinheiro extraía-se a resina e transformava-se a madeira no labor intenso das serrações e carpintarias. Até o eucalipto passar a dominar as paisagens.

A multifuncionalidade do território mais resiliente aos incêndios

Mais do que a mudança na paisagem, a transição da monocultura do pinhal para a predominância dos extensos eucaliptais trouxe grandes alterações na economia local/regional. A cadeia de valor tornou-se mais curta. Da multiplicação de empresas e empregos no setor florestal dedicados às atividades da resinagem, das serrações e das carpintarias, aproximámo-nos de um modelo de extrativismo dirigido ao abastecimento da grande indústria de celulose (pasta de papel), com reduzida atividade transformadora no território. Por outro lado, o valor económico do eucalipto é demonstrado na extraordinária capacidade de adaptação ao nosso clima e ao solo. Após a terraplanagem, procede-se ao plantio e ao fim de 9 anos as árvores estão aptas para o corte – que se traduz num fator competitivo relevante, considerando o crescimento mais lento noutras regiões do país. A capacidade de regeneração após o corte, e em situações pós-incêndio, é impressionante. Com relativa economia de esforço, o eucaliptal cresce e gera rendimento, quase sem ver o dono.

O tempo da difusão das monoculturas, entre o pinhal e o eucaliptal, coincide com a maior frequência na ocorrência de grandes incêndios florestais. Os fatores são múltiplos e complexos que não se resumem a questões restritas à gestão da floresta e ao dispositivo dos meios de prevenção e combate aos fogos rurais. A alteração da estrutura demográfica, marcada pelo êxodo rural, o despovoamento das aldeias e o relativo envelhecimento da população, assim como a mudança dos estilos de vida dos residentes, trouxe consequências no modo como nos relacionamos com a floresta. Na economia rural de outros tempos, todos os recursos agroflorestais eram reaproveitados: a madeira servia para a construção civil e a produção de lenha para o fogão e a lareira, as pastagens alimentavam o gado, da caruma e do mato fazia-se a cama dos animais, que por sua vez era o estrume que fertiliza a terra onde se semeia o pão. Havia um princípio de circularidade no espaço que se movia entre a aldeia, o campo, a floresta e a serra. Hoje, o denso arvoredo estende-se quase sem barreiras na monotonia da paisagem pelas serranias, adentra nas aldeias e ocupa terras de cultivo de outrora. Porém, as pessoas estão mais distantes da floresta, relativamente aos usos e proveitos que dela retiram. Haverá muitos mais meios de prevenção e combate aos incêndios, mas falta gente que cultive a terra e cuide da floresta. E, na falta de um melhor aproveitamento dos recursos florestais, acumulam-se resíduos e sobrantes que são o combustível ao fogo. Acrescentem-se as alterações climáticas, das chuvas intensas das invernias, que dão vigor à rebentação da vegetação primaveril, seguindo-se o estio prolongado dos verões quentes, secos e fora de época, como aconteceu em junho e outubro de 2017.

Gerir a floresta num território onde predomina o minifúndio agrícola e florestal

Sem acorrer em radicalismos, não fará sentido diabolizar o eucalipto, na mais-valia que significa o retorno financeiro para a economia local. É preciso melhor gerir os eucaliptais. No montante de 1,2 milhões de euros, financiado na totalidade pelos fundos do Plano de Recuperação e Resiliência, o projeto Castanheira Melhor Floresta contempla a intervenção em 1500 hectares de eucaliptal (530 hectares já executados), que inclui ações de desbaste, desmatamento e redução da carga de combustível. Simultaneamente, diminui-se o risco de propagação de incêndio e incrementa-se a rentabilidade das pequenas parcelas, apenas possível através da ação concertada empreendida pelo promotor do projeto, a Biond. Também a regeneração e a gestão das áreas de pinheiro-bravo, em declínio nas últimas décadas, tem merecido atenção da autarquia, nomeadamente através da intervenção promovida pelo ICNF, numa área de 200 hectares, localizada em terrenos municipais no parque do São João da Mata. No sentido de criar zonas de descontinuidade nas áreas de monocultura e promover a biodiversidade destacam-se dois projetos: i) a candidatura ao Fundo Ambiental para a criação da Área Integrada de Gestão da Paisagem (AIGP), numa extensão de cerca 950 hectares; ii) o projeto para a Prevenção da Floresta contra Agentes Bióticos e Abióticos, desdobrado nas ações de controlo de espécies invasoras lenhosas, com destaque para o combate à disseminação de mimosas e acácias, cobrindo cerca de 13 hectares, e na criação de mosaicos florestais, numa extensão de 200 hectares, a somar a outras ações de reabilitação, rearborização e reconversão de povoamentos florestais coordenadas pelo Gabinete Técnico Florestal (GTF).Tornando-as mais seguras, resilientes e sustentáveis, a proteção dos aglomerados populacionais contempla a criação de 36 Condomínios de Aldeia, encontrando-se 10 já aprovados em início de execução. A área de intervenção cobre a largura padrão de 100 metros sobre a faixa de gestão de combustível secundária envolvente às aldeias, preconizando-se a reconversão de terrenos de ocupação florestal (eucaliptos, pinheiros e espécies invasoras) noutros proveitos agrícolas e agroflorestais, através da valorização da agricultura de conservação, alargada ao uso de pastagens, ao cultivo de pomares e olivais, e à preservação do arbóreo autóctone. A par da limpeza de arruamentos e espaços públicos nas aldeias, assegurada por equipas municipais, tem havido um esforço continuado da autarquia na manutenção das faixas de gestão de combustível ao longo da rede viária municipal, através da contratação externa.

Do gabinete tecnologicamente bem apetrechado nos sistemas de informação geográfica e nas ferramentas digitais de monitorização do território, o Serviço Municipal da Proteção Civil tem feito um trabalho extraordinário no terreno, patente na prontidão da resposta a situações de emergência e em diversas ações preventivas, incluindo a realização de queimadas controladas em terrenos municipais e baldios e campanhas de sensibilização ambiental junto da população. As limpezas obrigatórias de terrenos particulares e a implementação dos Condomínios de Aldeia tem sido temas abordados nestas sessões de esclarecimento. Depois da compra de um biotriturador, colocado ao serviço do GTF, para o processamento de resíduos e sobrantes agrícolas e florestais, em substituição da realização de queimadas, a recente aquisição de um drone permitirá ampliar o alcance da Proteção Civil nos seguintes pontos de ação municipal em situações de emergência, catástrofe natural ou calamidade pública: Levantamento cartográfico de áreas ardidas e a deteção de pontos quentes em cenários de pós-incêndio florestal, através do uso de câmara térmica; Suporte à tomada de decisão em situações de risco de acidente e/ou de catástrofe, através da recolha de imagens em tempo real transmitidas ao centro de operações; Apoio em operações de busca e salvamento, fazendo uso do varrimento do espaço por meio de imagens aéreas (fotografia e vídeo) e câmaras térmicas de visibilidade noturna; Inspeção, rastreamento ou monitorização de áreas ou locais de difícil acesso, em missões complementares ou alternativas ao deslocamento de viaturas e operacionais; Apoio a outros serviços municipais que atuem nos domínios do ordenamento do território, ambiente e gestão da floresta, permitindo o mapeamento e medição de áreas de intervenção, o registo de imagens aéreas e a recolha de outros dados complementares de informação geográfica.

A memória da tragédia de 2017 e a celebração do “Dia de Portugal”

Duramente fustigado pelos incêndios de junho de 2017, numa tragédia sem precedente na incomensurável perda de vidas humanas e nos avultados danos materiais, a monotonia da paisagem recobre-se do imenso eucaliptal que se avista ao longo da EN 236-1, ao sul de Castanheira de Pera. O território regenera, mas é preciso melhor gerir a floresta. Pretende a Presidência da República inteirar-se do estado do ordenamento e gestão florestal nos concelhos afligidos na tragédia, procurando dar a conhecer essas ações em curso durante o programa das solenidades do Dia de Portugal, que se iniciará com o hastear da bandeira nacional junto ao memorial de homenagem às vítimas dos incêndios de 2017, no dia 09 de junho, pelas 10 horas. E mais pretende S. E. Marcelo Rebelo de Sousa, no exercício do supremo magistério de influência, religar o atual Governo Constitucional ao compromisso da coesão territorial, através da promoção do desenvolvimento económico, social e cultural mais sustentável e equitativo no todo nacional, com especial atenção para os territórios de baixa densidade demográfica do Pinhal Interior onde nos inserimos.

A economia do turismo e a valorização do arbóreo autóctone

Quase metade do nosso concelho está enquadrado na área da conservação dos habitats da rede europeia Natura 2000, inserido no sítio da Serra da Lousã. São manchas de floresta autóctone, onde predominam os carvalhos e castanheiros, que dão lugar à flora rasteja do manto de urzes e carquejas que cobre as vertentes das serranias e servem de pasto ao potencial apícola. Este quadro idílico estimula a olhar para a valorização das paisagens através da capitalização de práticas sustentáveis dirigidas à promoção do turismo de natureza. Foram mais de 32 mil os pedestrianistas que no ano passado percorreram os quatro percursos homologados ao redor das aldeias do Coentral e de Pera, a que se soma o milhar de caminhantes que participaram nas rotas singulares da agenda Doze Meses, Doze Caminhadas e do pacote turístico do Festival de Caminhadas da Serra da Lousã. Em suma, estas dinâmicas de turismo abrem novas perspetivas sobre a valorização da floresta e a preservação das paisagens. Ultrapassando a imagem negativa da tragédia de 2017, é preciso divulgar as potencialidades dos recursos naturais junto de quem nos visita, através de uma estratégia de promoção turística todo o ano. Roteiros que convidam a novas experiências imersivas na natureza, que não se esgotam nos refrescantes mergulhos de verão na Praia das Rocas.

Façamos da floresta e da beleza das nossas paisagens o cartaz turístico original e autêntico de Castanheira de Pera.